No final de Fevereiro deste ano estive presente numas Jornadas Apícolas em Oviedo nas Astúrias espanholas, organizadas pela União de Uniões em conjunto com a PROMIEL – Associação de Apicultores Profissionais das Astúrias, onde, aproveito para felicitar a organização, pois foram umas verdadeiras jornadas apícolas, de apicultores para apicultores, digamos que um exemplo a seguir, pois o palco foi unicamente dos apicultores, não havendo nada para vender, apenas sim, conhecimento de causa para partilhar…
Durante estas jornadas, de todos os temas (todos de grande interesse), o que menos esperava, foi o que mais me surpreendeu, a “RASPAGEM DA CRIAÇÃO”, “RASCA LA CRIA” em Espanha.
Antes de continuar, quero referir que já tinha visto um video sobre esta técnica e não tinha dado qualquer importância e inclusive pensado “há com cada maluco”! Basicamente não me tinha apercebido do potencial e das especificidades desta técnica.
Resumindo um pouco esta técnica, a mesma foi iniciada por Randy Oliver em 2014 (
http://scientificbeekeeping.com/messin-with-varroa-2014/), que fez umas experiências, contudo não passou apenas de experiências, aparentemente sem grande resultados, não tendo havido mais desenvolvimentos sobre este método.
Entretanto, no ano seguinte surgiu um grupo de apicultores espanhóis “RASCA LA CRIA” que iniciou este método, o desenvolveu, estudou e melhorou, tendo sido os resultados surpreendentes.
Tal como eles o disseram antes de iniciar a sua apresentação nestas jornadas, digo o mesmo, para alguns é necessário ir ao psicólogo antes de continuar a ler, pois a técnica pode chocar os mais sensíveis e românticos, tendo este grupo já sido acusado de serem assassinos de abelhas… algo que à primeira vista o pode parecer, contudo, trata-se de fazer exactamente o contrário, salvar abelhas a partir do sacrifício de criação que à partida já estavam condenada.
Este método trata-se nada mais nada menos que raspar toda a criação opérculada e em vias de opercular (larvas maiores que irão ser opérculadas nos dias seguintes), matando a mesma, de forma a expor toda a varroa em estado forético, aumentando a taxa de sucesso dos tratamentos em praticamente 100%.
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Foto retirada de http://scientificbeekeeping.com |
VER VIDEO:
Simplificando, trata-se de simular a ausência de criação, algo que pode ocorrer em algumas regiões do país em alguns períodos do ano.
Apesar de sabermos que esses períodos existem, como é o caso do inverno ou verão, dependendo das regiões de Norte a Sul, existem sempre colmeias que têm criação e os tratamentos nunca irão ser totalmente efetivos, vindo a ser estas mesmas colmeias focos de reinfestação nos nossos apiários, contudo, a má vizinhança acaba por levar com as culpas, quando a origem do problema está nos nossos próprios apiários. Colmeias que de forma isolada os tratamentos por algum motivo não funcionaram e nos vão causar problemas em todo o apiário nos meses seguintes aos tratamentos.
Ainda recentemente visitei um apicultor que ao fazer uma visita ao seu apiário a maioria das suas comeias estava com niveis baixos de varroa e encontramos uma das colmeias (a mais forte de todas), com 20% de infestação. Em 300 abelhas havia 60 varroas. Esta colmeia, juntamente com outras, vão ser autênticos viveiros de varroa neste apiário, numa altura critica em que os níveis deveriam estar baixos.
Outra das situações que ocorre quando nunca existe quebra de criação, é que nos momentos que esta se reduz, existem níveis elevados de varroa, pois os tratamentos nunca funcionam a 100%, estando as gerações seguintes de abelhas condenadas, pois nasceram na sua maioria com presença de varroa e apesar de no Outono, aparentemente estar tudo bem, quando chega o Inverno as colmeias começam a morrer, pois temos abelhas debilitadas e doentes.
Este método, ao ser feito na totalidade das colmeias, vamos equalizar as mesmas ao mesmo nível de infestação de varroa, e caso o mesmo seja feito de forma concertada por um grupo de apicultores na mesma região, os níveis de varroa baixam exponencialmente.
Não vou descrever este método, pois ainda não o experimentamos nas nossas colmeias para poder opinar ou falar de forma pormenorizada, contudo apenas dizer que o vamos experimentar no final de Agosto, inicio de Setembro, assim que retirarmos o mel de Castanheiro e melada de carvalho, pois nesta altura temos as colmeias reduzidas no máximo a dois pequenos quadros de criação, ou em alguns casos ausência total de criação, aproveitando a estimulação de Outono para recuperar as colmeias, com várias gerações de abelhas livres de varroa.
Vamos seleccionar um período de quebra de criação e inicio de estimulação pelas primeiras florações de final de verão e inicio de Outono, algo que é fundamental nesta técnica.
Para os mais sensíveis e cheios de ética, as abelhas que são raspadas e mortas neste período, já estavam condenadas, pois estão sob a presença de varroa. Durante este período de redução de criação nas colmeias, umas vez que tivemos uma fase produtiva há poucas semanas, os niveis de varroa estão altos, estando essa mesma criação na presença de varroa, sendo à partida abelhas já condenadas.
Tal como disse um dos elementos deste grupo “RASCA LA CRIA”, o veterinário apícola Carlos Marín Barcáiztegui, um veterinário não duvida em fazer abortar uma vaca para a salvar e neste caso trata-se de matar criação condenada para salvar a própria colónia de abelhas.
Ainda assim, ficam os ovos e larvas até 3 dias (apróx.), perdendo-se apenas 15 dias de criação.
Após a raspagem da criação, nesse mesmo dia é aplicado um tratamento à base de amitraz (ex: APIVAR, APITRAZ), sendo o produto químico com efeito mais rápido e efetivo do mercado, de forma a matar todas as varroas presentes antes de haver nova operculação da criação seguinte, evitando que haja a possibilidade de algumas varroas sobreviverem e poderem entrar novamente nos alvéolos, reproduzir-se novamente e baixando o sucesso deste método.
Este grupo já estudou esta situação e só raspar a criação opérculada não é suficiente, pois vai haver sempre algumas varroas que conseguem escapar ao efeito do tratamento nos dias seguintes e voltar a entrar na próxima criação. É importantíssimo raspar também as larvas maiores, que se encontram em redor da criação operculada ou irão ser opérculadas nos dias seguintes.
É de todo importante evitar produtos com baixa eficiência ou produtos que demorem a actuar como é o caso de muitos produtos biológicos (ácido oxálico, timol, etc.).
Após a aplicação das tiras de tratamento é colocado um xarope de açucar (50/50) de 8 em 8 dias criando alguma estimulação e subsequente efeito higiénico nas colónias para limparem toda a criação morta e prepararem os alvéolos para a rainha fazer nova postura.
Foram apresentados alguns videos onde se seguiram algumas colmeias após raspagem, e os resultados são surpreendentes, muitas colónias passam de criação salteada para criação compacta e bastante bonita!
Um dos apicultores pioneiros desta técnica, “Ramón”, com uma exploração de 1600 colmeias, diz que consegue sentir as abelhas ao nível de quando não existia varroa, que as abelhas se comportam de maneira diferente. Diz que costumava ter percas anuais de 300 ou 400 colmeias e desde que começou a usar esta técnica baixou para 40 e poucas colmeias. Algo inacreditável!
Este apicultor, no próprio dia que retira o mel da produção de Verão, raspa a criação, aplica o tratamento e coloca uma bolsa de alimento estimulante, evitando desta maneira ter de regressar novamente aos apiários.
Os próprios sucos, fruto da raspagem da criação acabam também por ser uma nutrição para as abelhas da colónia, que respondem muito rapidamente ao estimulo de criar nova criação.
Esta raspagem deve ser forte e vigorosa (até salpicar) de forma a termos a certeza que toda a criação fica morta.
Os excelentes resultados que este grupo apresentou, começam já a correr o mundo, acreditando que pode ser uma boa solução em alguns países ou regiões onde nunca temos a ausência total de criação na totalidade das colmeias, sendo um problema controlar a varroa.
E esqueçam a técnica de enjaular a rainha para obter o mesmo efeito, como fazem por exemplo em Itália, pois essa técnica além de todos os problemas (morte da rainha enjaulada ou substituição após libertação), morosidade, etc, não funciona bem com a abelha ibérica.
Os que queiram criticar esta técnica, por questões éticas, morais, romantismo, etc, olhem para eles próprios e preocupem-se em dar o exemplo, em vez de criticar por criticar… e na pior das hipóteses marquem uma consulta no psicólogo.
Os que achem que pode ser uma boa técnica a usar nas suas colmeias, experimentem e melhorem a mesma.
Termino dizendo que se não tivesse ido a estas jornadas e ouvido o que ouvi pela boca dos pioneiros desta técnica, iria demorar um pouco a ver e aceitar o seu potencial! Partindo esta técnica de um grupo que não tem nada para vender… pensem sobre isso e experimentem antes de se colocarem a criticar e a criar suposições, pois tenho consciência do que matar criação representa para muitos apicultores… e… até mesmo para mim.
Mais alguma informação em:
https://www.latiendadelapicultor.com/blog/rasca-la-cria-varroa/#ORIGEN_DEL_METODO
João Tomé
…um apicultor, pela apicultura…